A Masmorra

 

 

Estava um homem sobre a vigilância de um carcereiro, quando este se encontrava preso em uma masmorra, que ficava no inte­rior de uma grande montanha, de modo que aconteceu de um dia o carcereiro que o vigiava ter saído. E esquecendo o carcereiro ao molho de chaves próximo a porta da qual ficava a cela do homem vigiado, ele percebendo-a ao longe — mas não muito donde estava a sua cela —, tirou a sua calça e a camisa de maneira que torcendo-a conseguiu fazer uma corda.

Por sua vez, logo após tê-las torcido e feito à corda, o homem fez com a colher das suas refeições a um gancho como a de um anzol e o prendeu a corda de roupas para poder ao molho de chaves conse­guir “pescá-la”, dado que, conseguindo o prisioneiro pegar as cha­ves, este encontrando a que correspondia a da sua cela, abriu a porta da sua prisão e conseguiu escapar, fugindo pelo esgoto do cala­bouço.

Dessa forma, ao fugir do cárcere, este homem chegou a uma flo­resta através do canal do esgoto que terminava num rio, e vendo a luz do sol e sentindo o ar puro da selva, a Deus excla­mou:

— Obrigado Senhor! — disse com os braços abertos em meio à floresta. — Por ter me dado à oportunidade de poder escapulir da­quela masmorra. Pois, estando eu preso injustamente, há muitos anos perdi. No entanto, sempre tive fé no Senhor, e sabia que um dia o Senhor se compadeceria de mim, e me daria à oportunidade de me libertar.

Seguidamente ao proferido pelo homem, um anjo reluzente apa­receu-lhe por diante, e lhe falou:

— Tu não foste preso injustamente! — afirmou o anjo apon­tando-lhe o dedo. — O teu crime — ainda que não tenha sido co­metido nesta vida —, em outra tu o cometeste.

Logo, perplexo com aquela aparição sobrenatural, o homem tre­mendo de medo caiu de costas sobre um pequeno monte que havia em meio à mata, e ao anjo indagou-lhe:

— E como tu sabes estas coisas? Quem és tu e donde vieste? — disse virando o rosto e protegendo-o com as mãos do forte clarão que reluzia do anjo.

— Eu Sou quem conhece os teus caminhos! — respondeu-lhe o anjo. — Pois, sendo eu quem a ti sempre observei-te, eu o vi come­ter crimes que tu não pagaste em outra vida, de modo que, sendo a justiça à lei eterna, foi-lhe dada uma sentença, para que mesmo nesta vida tu não tendo cometido crime algum, tu tiveste que pagar por o que em outra cometeste.

Contudo, intrigado, o homem ao anjo perguntou-lhe:

— Como pode isso? O que eu fiz em outra vida, e que não me lembro, para que nesta vida eu precisasse passar, por todas as humi­lhações que passei?

— Tu em outra vida fizeste o que muitos fazem em todas as vi­das em que encarnam. Tu tiraste o que não lhe pertencia de outro homem — apontou-lhe o crime o ente divino — e tomando o que não era seu por direito, tu tevês que “equilibrar a balança” cum­prindo pena pelo o que tu roubaste, porém, não “pa­gando na mesma moeda”, como dizem, no entanto, tendo que ficar encarcerado “in­justamente” nesta vida. Por isso, foste tu confundido com outro criminoso que ao crime o qual tu pagaste cometeu, de ter tirado a vida de uma pessoa que era ino­cente, cometendo latrocínio pelo mesmo motivo que o levou a prisão, ao tentar se apossar de uma joia que não lhe pertencia.

À vista disso, inconformado pela justificativa que o anjo prestou-lhe sobre sua pena, o homem o questionou:

— E qual foi o crime que eu cometi nesta minha última encarna­ção?

— Tu de outros roubaste, o que elas tinham em segredo. Por­tanto, tu ficaste sabedor deste segredo que deles tomaste o que eles tinham guardado, e usu­fruindo deste segredo, tu os prejudicaste, pois, tirando o que era por direito e justiça concedidos a eles por Deus, tu não devias deles ter surru­piado, o que não lhe foi confiado pelo divino e eterno saber.

— Mas que segredo foi este tão importante que eu roubei, e que a tantas pessoas prejudiquei? — perguntou o homem surpreso ao anjo.

— Tu roubaste o que lhe fora proibido de saber pelos anjos. E, sabendo destes mistérios, tu aproveitou-se do segredo que tinha des­coberto e dele fez mau uso, e assim pre­judicou a muitos. De certo, o segredo que tu roubaste foi ter se apropriado de um livro místico que continha saberes espirituais que existem em oculto! Mas como ainda tu não tinhas o preparo e a iniciação necessária para estas for­ças sobrenaturais manipulá-las, elas a ti manipularam. Pois sendo tu muito negligente em usá-las, elas te usaram e fizeram de ti, instru­mento de muitas iniquidades.

Todavia, notando o homem que o anjo estava lhe falando de as­suntos espirituais, para ele perguntou:

— Mas que segredo foi este que roubei, e que a muitos prejudi­quei, por não saber usá-lo adequadamente? Foi algo sagrado? Pelo o que me dizes, parece que o que fiz foi ter usado de magia para con­seguir alguma coisa que eu desejava muito.

— Sim! — respondeu-lhe o anjo. — Tu obtiveste acesso a misté­rios, que não lhe cabiam naquele momento conhecê-los! Pois, es­tando tu muito motivado em descobri-los, tu usaste da audácia e astúcia para poder ter acesso a eles, e conseguindo acessá-los, usou-os indiscri­minadamente, de maneira que, não tendo o preparo ade­quado para deles fazer bom uso, tu fizeste mau uso. Logo, foi dessa maneira que estes espíritos das sombras manipularam os teus desejos e paixões, e causaram em ti um grande estrago, que lhe fez não só se auto-preju­dicar, como também, a quem em seu caminho atrapa­lhava-o de con­seguir realizar os seus intentos maldosos.

Diante disso, preocupado por ter sabido o que fez em sua última encarnação, o homem ao anjo disse:

— Eu fiz então uma grande tolice!

— Sim! — corroborou o anjo.

Continuou o homem:

— O que me motivou a querer saber sobre estes mistérios, mesmo não estando preparado para sabê-los?

— Tu foste motivado pelo desejo intenso de viver de forma mundana a vida na Terra! Mas, não tendo os recursos necessários para isso, percebeu que poderia consegui-los de maneira sorrateira e infame. Ou seja, tu sabendo que dos mistérios do espírito pode o homem beneficiar-se, quando sabe usá-los, tu procuraste por quem destas forças conheciam (os inici­ados nestas ordens místicas e esoté­ricas). Todavia, eles a ti negaram dizer e ensinar sobre estes segredos sagrados, por ver que tu não estavas preparado para aprendê-los. E não aceitando que te fosse negado este conhecimento, foste per­verso e audaz! Visto que, usaste da astúcia e da insensatez, para po­der obter o que lhe foi negado para o bem (ao praticar por conta própria sem a devida instrução o uso destes conhecimentos sagra­dos), mediante o livro o qual tu rou­baste.

Por causa disso, o homem ao anjo questionou-lhe:

— Mas então eu fui tão perverso assim, por ter me apossado destes conhecimentos sobre magia? O que eu queria tanto saber, que fui capaz de cometer roubo para destes segredos me apos­sar?

— Tu querias conseguir privilégios e bens materiais, sem se es­forçar para merecê-los! Assim, tu querias obter, o que não lhe era por direito possuir. Pois, não tinha a disciplina e nem a força de vontade para se prestar a estu­dar e a aprender. E agindo assim, tu preferiste buscar no ocultismo, o que deverias primeiro ter buscado aprender com a sabedoria! — declarou o anjo. — De fato, tendo a oportunidade de estudar para aprender, e de se firmar em verdade e justiça, tu preferiste procurar nas forças das trevas as quais desco­nhecias se apossar de um poder, para usá-lo em prol dos seus dese­jos egoístas. E, sa­bendo estas forças (demônios) que tu não eras digno de trabalhá-las, elas te usaram por um tempo concedendo-lhe o que para elas tu pe­dias, mas cobrando-te um grande preço por delas ter se beneficiado, de maneira que, nada do que tu conseguiste, foi pelo teu mérito! E sim, por teres usado do conhecimento das sombras.

Em função disso, assustado com tudo aquilo que o anjo estava narrando para ele, o homem, perguntou-lhe:

— Mas Senhor! Por que eu não me lembro destas coisas ruins, que fiz em minha última encarnação?

— Tu não te lembras — disse-lhe o anjo — para justamente ter que aprender a se lembrar delas, pelo o que tu passaste de ruim na masmorra! Já que, tudo o que ao homem acontece de mal, é porque em algum momento ele semeou as sementes do fruto maligno em sua vida, através dos desvios e atalhos que o mesmo percorreu ten­tando alcançar os seus objetivos de maneira mais fácil. Desse jeito, o fruto dos teus tropeços cresceu e multiplicou-se, e a muitos envene­nou, inclusive a ti, que foste aos poucos sendo con­sumido por den­tro.

Em razão disso, horrorizado pelo o que ouviu, o homem replicou ao anjo:

— Então quer dizer... — titubeou — que todos estes anos que estive encarcerado, não foram injustamente?

— Não! — respondeu-lhe o anjo.

Prosseguiu o homem:

— Logo, esses anos que passei na masmorra, me foram cobrados, por eu ter aos mistérios sagrados profanado-os?

— Sim! — confirmou-lhe o anjo.

Doravante, consigo, o homem pensou e indagou-se:

— Mas como eu me deixei agir pelos desejos e paixões egoístas que me tomaram o coração, e a mim mesmo e a tantos outros preju­diquei?

Não obstante, sabedor do que ele tinha pensado em oculto, o anjo lhe respondeu:

— Tu destes mais importância as coisas terrenas e profanas, do que a sabedoria das idades. E, conjurando a forças demoníacas das quais não as conhecia e nem tinha preparo para com elas lidá-las, tu invocaste para a tua vida e para a de outros, poderes pelos quais o mau uso acarretou em tragédia, de forma que, estas forças de ti vin­garam-se encarcerando-o na masmorra pelo o crime que não come­teste nesta vida, mas na última que encarnaste.

Porém, perguntou o homem confuso pelo o que es­tava sabendo:

— Mas por que eu dei mais valor à vida terrena do que em estu­dar para aprender sobre os saberes espirituais?

— Tu amaste mais as tentações do mundo, do que a santidade do Divino Espírito Santo, porque se apegaste aos prazeres e ao ócio, ignorando o chamado do Santo Espírito que através de ti querias por fazê-lo sabedor do teu propósito de vida aqui na Terra!

Entretanto, envergonhado, o homem retorquiu ao anjo:

— E eu terei que continuar a pagar pelas coisas que fiz de errado ao sucumbir às paixões e desejos que tive, sem me esforçar por usu­fruí-los por mérito próprio do meu laboro?

— Depende de como tu levarás a tua vida, por daqui em diante! — respondeu-lhe o anjo. — Pois, tu tiveste a chance de conseguir da masmorra escapar. E agora que tu tens a oportunidade de a uma nova vida começar, és tu quem deverá procurar seguir por bons ca­minhos! Ou seja, sabendo a luz que tu deves segui-los, a estas lhe dará a oportunidade de encontrá-los. Mas, ainda tu terás por tenta­ções a te provar! — avisou-o. — Ao passo que, o que fizestes de errado no passado, ainda de ti lembram-se aqueles com quem tu te meteste. E estes, irão te provocar as coisas mundanas novamente querer apossá-las, pois tu deves-lhes favores pelos quais ainda não os pagaste, ao contrair com eles pactos de riqueza e poder.

— E como poderei agora livre da masmorra — inquiriu o ho­mem ao anjo cabisbaixo —, seguir em frente com a minha vida? Se não tenho para onde ir, nem o que fazer para me manter?

— Confias naquele que de dentro de ti falas em silêncio, e ele a ti os bons caminhos irá te mostrar! Pois, sendo ele o sabedor de todas as coisas, ele sabe quais são os melhores caminhos que tu poderás rumar-te.

— E como eu posso encontrar esse que de den­tro de mim fala se não o conheço? — retrucou o homem ao anjo.

— Tu o conhecerás, quando procurá-lo mediante meditações e silêncio!

— E como eu posso encontrá-lo, se eu nunca tinha antes ouvido dele falar, até tu me dizer agora? — indagou o homem.

— Tu o encontras, quando voltando para dentro de si em silên­cio, se esforça em ouvi-lo! E ele quando a ti perceberes estar se es­forçando para encontrá-lo, a tu responderás por sinais, toques e pa­lavras, que perceberás ao teu redor, mediante ao que no­tares em tuas observações.

E, dando-se em conta o anjo estar a falar para que ele buscasse a Deus em oração no seu interior meditando, o homem ao anjo tor­nou a perguntar-lhe:

— Como eu faço para voltar para dentro de mim, e poder ouvir a Deus que fala em silêncio? Isso me parece impossível!

— Tu tens que ter o hábito de praticar meditações como já te fa­lei, e procurar falar menos e ouvir mais! — disse-lhe o anjo. — Desse jeito, ouvindo mais do que falando, perceber-te-ás que há no mundo muitas oportunidades, e que tu estando preparado, poderá delas se aproveitar, e aprender com elas a alcançar o seu propósito.

Logo, satisfeito de ter o anjo a ele ensinado todos esses saberes espirituais, o homem ao anjo agradeceu-lhe:

— Obrigado! — disse com um leve sorriso no rosto e com certo alívio na alma. — Por ter-me educado a esse novo caminho co­nhecê-lo! Uma vez que, sendo eu tão cruel e tão insensível com o próximo na minha última encarnação, ainda assim, teve Deus pie­dade de mim. Visto que, só Deus pode ao homem socorrer, quando este está em desespero e penúria.

Falou-lhe o anjo:

— Sim! Foi Deus quem me mandou, para que eu te abrisse o olho do espírito! Haja vista estando tu com ele fe­chado, a muitas mazelas cometeste. E estando cego em meio a per­versidades, a muitos infortúnios atraiu para si, e para os demais que de ti quiseram se aproveitar ou que tu se aproveitaste.

— Eu fui vingativo também? — interpelou o homem ao anjo surpreso.

— Sim! — respondeu-lhe o anjo. — Além disso, sendo tu muito inescrupuloso, agiu perseguindo aos que de ti quiseram de alguma forma se beneficiar ou te livrar de praticares o mal. E não lhes dando o devido afastamento mediante a misericórdia, preferiste a vingança em seu ódio buscá-la, para que dela pudesse fazer o que considera­vas justiça usando de sortilégios malévolos. E fa­zendo da vingança o seu instrumento de satisfação, ela também o usaste, de maneira que ela lhe feriu, e lhe tirou a vida por meio de uma doença fatal (lepra), para que agora estando encarnado novamente nesta vida, tu possas aprender a procurar pela sabedoria que a ti poderia ter orientado por bons caminhos no passado, e não ao egoísmo e ao ódio que o le­vaste a morte tão de­sonrosa.

Porquanto, entristecido, o homem ao anjo falou-lhe:

— Que vergonha eu sou!

Porém, disse-lhe o anjo:

— Não se lamentes! Tu deves fazer o que te en­sinei a fazer! Pois, agora que tu deves a muitas coisas ter que aprendê-las, de modo que, tu deves agora buscar fazer o certo, e não o que antes fizeste errado. Encon­tre aquele que em ti fala em silêncio, e tu encontrarás a ilumi­nação para os teus caminhos! De sorte que, o homem perdido em trevas só pode a luz encontrá-la, quando para Deus ele se esforça em retornar.

Posteriormente ter revelado ao homem o seu crime, o anjo desa­pareceu como a um relâmpago. E o homem se reco­brando do susto que havia tomado, sozinho, em meio à floresta continuou a andar até encontrar a um vilarejo.

Conseguintemente ao chegar neste vilarejo, ele entrou em uma das casas e deparou-se consigo mesmo deitado em uma cama so­nhando, de modo que ele percebeu que toda aquela experiência que ele havia tido, nada mais era do que uma viagem astral que ele havia feito, e que o anjo que o havia orientado, era o seu sagrado anjo guardião que se tinha revelado a ele e contado sobre os feitos malé­volos que ele havia praticado em suas encarnações anteriores.

Desse modo, pois, foi assim que este homem descobriu que havia partido para um lugar desconhecido, um reino onde ele havia sido prisioneiro, e que passado longos anos numa masmorra, ele havia conseguido escapar.

E, se recobrando do susto, ao se levantar da cama — mas se lembrando do sonho que havia tido como se fosse real —, ele come­çou por praticar ao que o anjo o instruiu a fazer, de forma que se espiritualizando, compreendeu melhor os desafios pelos quais ele passava no seu cotidiano, e ouvindo a sua intuição, pode transcender melhor as suas batalhas cotidianas através das orientações que o seu mentor espiritual ia lhe instruindo em silêncio a como conseguir vencê-las, por meio da disciplina, meditação e empenho nos seus estudos e traba­lho com sua chama interior.

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Sinopse

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