O Ancião

 

 

Houve em um tempo muito longínquo, aonde os homens ha­bitavam o mundo junto com as divindades Olímpicas, a crença quase unâmine entre as comunidades, de que toda a humani­dade também era filha desses seres espirituais. Porém, aconteceu que um caçador chamado Orionis, buscando saber mais sobre a sua ori­gem espiritual — por não acreditar ser filho dessas entidades — foi para um lugar distante da terra dos homens, onde habitava um se­nhor de muita idade, conhecido por ser entre os povos um grande sábio, e que vivia como a um eremita no cume de uma cordilheira.

De fato, após uma longa jornada extenuante em meio ao frio ri­goroso e despenhadeiros traiçoeiros, eis que o aventureiro conseguiu chegar até o topo desta cadeia de montanhas. Dessa forma, encon­trando a esse senhor (que morava em um castelo em ruínas abando­nado, e que se apresentava iluminado por um candeeiro no alto de sua torre), subindo as velhas escadas, e chegando ao aposento onde o ancião se achava, dirigiu-se a ele dizendo-lhe:

— Senhor! — exclamou. — Vim de muito longe para consultá-lo. — proferiu respirando cansado, devido ao longo percurso percor­rido. — Tu tens muita sabedoria e vejo em ti grande luz! — observou. — Não obstante, por que aos homens é negado sabermos a nossa verdadeira origem espiritual, se somos semelhantes aos deu­ses, e os deuses, são semelhantes a nós? Como podemos ser filhos destas divindades, se elas nos oprimem quando não a adulamos? E se a bajulamos, elas nos ignoram, por nos acharem seres inferiores diante do nível espiritual mais elevado delas?

Por conseguinte, esse senhor observando-o com atenção, e ou­vindo as palavras que o homem pronunciava (com a devida concen­tração dada a cada uma delas), respondeu-lhe:

— Sois vós — como já dito pelos antigos mestres espirituais — deuses.  Vós deveis antes de se enxergarem como a homens de carne e osso, verem-se como a deuses em forma humana, porém imortais! Certamente, o individuo só se descobre um “pequeno deus”, quando esse ao verdadeiro e único Deus, acha-O dentro de si.

Destarte, Orionis, então, pensativo sobre o que o ancião lhe disse, redarguiu-lhe:

— Mas como podemos ser deuses... — questionou com certa he­sitação — se a esse a quem o senhor diz ser o único Deus, ainda não O encontramos dentro de nós? Ou seja, pelo menos — penso eu — a maioria das pessoas ainda tem dificuldades em encontrá-Lo. Tal­vez, seja mesmo por falta de fé. — aludiu o caçador com certo pesar. — Por certo, alguns seres humanos não acreditam Ele residir co­nosco, quer dizer, existir.

Todavia, o ancião com muita sabedoria, respondeu a Orionis:

— Vós sois filhos da luz, quando a luz vós a buscais e a encon­trais dentro de si, ouvindo aos seus corações! Por outro lado, vós sois filhos das trevas, quando a estas se submetem em corpo e alma — mas nunca em espírito — ao buscarem satisfazerem as vossas paixões carnais. Afinal, espírito é o que sempre vós fostes por natu­reza — a centelha divina de Deus. Além do mais, a alma, é o que define o que vós sois encarnados, com o propósito de na Terra ser­vir, obrando o bem, tanto quanto o mal, de acordo com as vossas escolhas. Portanto, os deuses dos quais tu não crer ser filho deles, é quem por meio de ti, dirigem o teu destino. Por isso, tu te incomo­das com as oferendas que lhes fazem os homens, pois, estas ofertas são antes de tudo, uma oblação a vós mesmos, por já serem — desde a queda do paraíso — conhecedores do bem e do mal.

Diante disso, Orionis, pensativo e muito aborrecido com o que o ancião lhe falou, tentou tirar dele uma resposta mais objetiva:

— Senhor! Nós homens sabemos que a um único Deus existente, e só! Por que somos feitos a imagem e semelhança d´Ele, se somos tão diferentes entre nós?

— O Deus único é o que habita em todos os homens! — res­pondeu-lhe o ancião. — Daí os homens serem semelhantes a Ele; e Ele ser “deuses” em toda a humanidade. O que nos define como sendo a imagem e semelhança do Creador, é termos a consciência de que Ele em nós vive em comum entre todos os habitantes da Terra, como também, do Céu. Todavia, só O descobre quem a Ele busca dentro de si, ouvindo ao seu silêncio interno! Afinal, achando-O em seu esconderijo — o vaso sagrado onde ele deposita a sua luz — alegra-se quem O encontrou, de saber que somos filhos d´Ele; e Ele é nosso Pai, haja vista ser Ele quem nos creou.

— Mas senhor... Por que têm o homem por Pai à luz e por Mãe as trevas? — questionou Orionis confuso ao ancião. — Se somos todos — inicialmente — filhos da luz? Oras, por que o homem tem como Mãe a escuridão, que o castiga e o faz sofrer?

— Sim! Somos todos filhos da luz! — corroborou o ancião. — Entretanto, as trevas é a Mãe de todos os homens e de todos os as­tros, e de tudo o que existe manifestado no mundo físico, de tal modo que vós deveis respeitá-La, por ser o véu da noite, ou seja, a rainha do céu! Por certo, ela é a essência divina que mantém em cati­veiro o espírito na carne dos homens, e nos corpos celestiais, a cons­ciência angélica dos astros. Portanto, sendo no templo que o espírito reside em função da vontade do Pai, é através dele que o filho realiza a vontade de Deus, obrando por meio do corpo, as obras de sua onisciência! Consequentemente é do Santo Espírito que provêm à sabedoria dos homens, por ser ele o sopro divino de Deus.

Em suma, Orionis perguntou uma última vez ao ancião, antes de sair do castelo e se despedir do velho:

— Senhor! Sei que tens muita vivência e que a tua sabedoria pro­vém da luz. Mas responda-me, por favor: Por que ao homem é so­frível se iluminar, se Deus nele é vivo? O que o atrapalha (ao longo da sua peregrinação de vida na Terra), de conseguir ascender de novo, como ao sol, de volta ao céu?

— Ó homem! — exclamou. — Vós sois filhos de Deus! — res­pondeu-lhe o ancião novamente. — Ademais, Ele por Pai vos é. Portanto, Ele é quem a ti e a nós todos creaste. No entanto, o ho­mem por ser mesquinho em suas atitudes, O nega em seu coração! — lamentou-se. — Por cuja causa, ao negá-Lo, busca a satisfação no corpo, por não cultivar em espírito, a sua instrução, ouvindo o seu verbo sagrado reverberar do coração. De fato, nós todos temos por Pai a luz — a centelha divina de Deus — que nos torna semelhantes a Ele em espírito e verdade! Não obstante, sendo o homem uma expressão da vontade d´Ele, e tendo o homem que descobri-Lo ou­vindo ao seu silêncio interno, logo, cabe a cada ser humano bus­car se divinizar (não idolatrando a outros deuses em forma humana ou mesmo animal). Mas, por outro lado, obrando em silêncio a obra de Deus. De tal forma que ao encontrá-Lo, todas as pessoas devem em suas almas se permitirem ao Creador realizar por meio delas o seu mistério! Porquanto, esta é a finalidade da humanidade — enfa­tizou o velho —, ser uma fonte de vida na Terra; e ser semelhante ao Cre­ador em virtude e amor entre todos os povos.

Posto isto, Orionis se despediu do ancião cheio de sabedoria e verdade. Entretanto, o eremita lhe deu por último um conselho, antes dele voltar para a Casa e compartilhar com a sua comunidade — no tocante a sua jornada até o alto da montanha —, a sua experi­ência com o velho asceta:

— Lembre-se sempre — disse apontando-lhe o dedo o ermitão — vós sois para Deus, o que Deus é para o homem — uma centelha de luz. Tenha-O sempre no teu coração, porque é a ti quem Ele ama; e é em ti que Ele realiza o seu mistério! Dessa forma, por amá-Lo, Ele se revela através de ti, por meio dos seus méritos. Tu se ve­rás a imagem e semelhança do Eterno, quando em espírito descobri-Lo dentro de si, em justiça e verdade, ouvindo ao seu silêncio in­terno. Consequentemente, de igual modo, meditando e estudando tu tam­bém O acharás! Ademais, encontrando-O na retidão dos teus passos, ao longo da sua vida na terra, tu agirás de forma análoga ao Pai, ao obrar os teus projetos inspirado pela virtude e bem-aventu­rança do seu maná. Porquanto, Ele te enviará — do mais alto do céu — como intuição, desse sagrado alimento. Assim seja!

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Sinopse

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