O Pomar

 
 
 
 
Durante todos os finais de tarde, no transcorrer dos dias, havia um caseiro que se preparava para fazer o seu trabalho durante o cair da noite, que era vigiar um bonito pomar de ameixas. No entanto, certa vez, por negligência sua — devido ao seu despreparo em se armar devidamente — durante a madrugada, aconteceu delas terem sido roubadas por invasores, que as ameixas colheram e as ameixeiras quebraram, ficando o guarda, ao amanhecer, sem ter como delas se beneficiar.

Por causa disso, descontente, o homem se expressou:

— Quão irresponsável eu fui! — se culpou o vigilante. — Tenho mesmo que me danar! — esbravejou demonstrando remorso pela sua imprudência. — Por certo, sendo eu o responsável por cuidar das ameixas durante a vigília, além de tudo, também, deixei que os ladrões avariassem as ameixeiras, de modo que me privaram de po­der apanhar dos seus saborosos frutos, todas as manhãs.

Ademais, o homem continuava angustiado pelo prejuízo que ob­tivera, a tal ponto de ter chegado, até para Deus se lamentar:

— Ó Deus! — exclamou. — Por que fui tão irresponsável com a minha obrigação? — questionou-se cheio de remorso. — Tenho sido muito negligente em não cumprir com o meu dever de me poli­ciar, de maneira que devido a minha autossabotagem, continuo te­nazmente insistindo em não fazer direito o meu trabalho, quando, na verdade, deveria ser mais responsável em dar continuidade em rea­lizá-lo com esmero.

— Oras! Tu és muito cara de pau. — disse-lhe um anjo que para o homem surgiu repentinamente, como a um relâmpago, e o criti­cou. — Porque, tu sabias ser o encarregado pelo pomar de ameixas, e delas não cuidaste, por ser preguiçoso em sua incumbência de vigiá-las.

— Sei que sou o culpado pelo o que ocorreu! — retrucou o ho­mem envergonhado notando ser a voz de um anjo, que lhe falara. — Entretanto, não me exímio de ter sido imprudente de a isso ter dei­xado acontecer. Ou seja, sendo eu o responsável pelas ameixas — e pelas ameixeiras que produzem as ameixas —, se eu tivesse acatado com o meu dever, eu teria a possibilidade de lutar contra os salteado­res que me furtaram, com os recursos próprios de um sentinela (temperança; justiça; fortaleza; prudência), para aos bandidos ex­pulsá-los do pomar.

Todavia, o anjo, percebendo no vigia que este tinha sido muito sincero em assumir a sua vergonha, para ele falou:

— Ó homem! Vejo que tu estás mesmo a se sentir envergonhado por não ter cumprido com o seu encargo. Eu tenho daqui do alto — onde estou — te observado, de maneira que percebi, por assim di­zer, que tu és negligente em assumir as tuas obrigações, razão pela qual deixei que sucedesse a ti esta desgraça, para ver se tu acordavas e apercebesses dos erros que estupidamente praticavas. Portanto, por seres desleixado com o teu dever, estás agora a colher dos frutos amargos do teu descuido. Por isso, é que tu te sentes culpado, por tê-los anteriormente semeados com a tua preguiça, e falta de com­promisso consigo mesmo.

Por conseguinte, o vigilante se deu conta que este ser divino, po­dia aos seus caminhos abri-los ou fechá-los, de modo que ao anjo retorquiu:

— Senhor, como que eu posso me tornar uma pessoa melhor, se continuo me limitando a ter pensamentos embaraçosos, e a ser ne­gligente em assumir com responsabilidade a minha obrigação, de defender com coragem e determinação o meu pomar?

— Tu te tornas melhor — disse-lhe o anjo — sendo mais côns­cio do teu dever de vigiar-se (meditando e ouvindo o seu coração), para que eu posso através de ti obrar as maravilhas que tu és profici­ente de realizar, mediante do teu esforço e trabalho.

— Mas como eu posso te permitir deixá-lo fazer algum ofício — pensou o homem consigo mesmo — se nem eu sei onde e como achá-lo? Não sou, por certo, dono do meu próprio destino?

Em vista disso, o anjo, sabedor do que o homem tinha em pen­samento, respondeu-lhe:

— Tu me encontras quando no teu íntimo me procuras. Desse modo, a mim acharás, quando se dispuseres a fazer, o que de melhor foste dotado para neste mundo obrar. Ademais, tu saberás que eu sou quem te oriento o que deves ser feito, quando tu te permites ouvir-me intuindo-te o que lhe digo para que obres (haja vista eu ser o portador da luz da sabedoria do Eterno).

— Se assim é... — replicou o homem — então por que eu não me fiz por vigia das ameixas e das ameixeiras? Não és tu que por meio de mim age, intuindo o teu conhecimento? Certamente, pois, tu também deverias de responsabilizar-se por elas, me alertando do perigo de me roubarem.

— Oras! — redarguiu o anjo contrariando-o. — Foste tu que primeiro a mim negaste! — respondeu-lhe acusando-o pelo tropeço. — Ao permitires que a ti roubassem!

— Mas como? — refutou o homem inconformado. — Se eu nem a eles vi, muito menos sei quem são?

— Tu não os viste! — retrucou o anjo acusando-o do seu des­cuido. — Mas eles a ti viram! — afirmou-lhe. — Porventura, foi durante a tua negligência que tu os chamaste, e estes a ti vieram.

Não obstante, o vigia estava revoltado com o que o anjo impu­tava-o. E, contradisse-o renitente:

— Mas como eu posso ter chamado a estes ladrões, uma vez que era o meu dever vigiar o quintal, ao invés de “convidá-los” a me roubarem o pomar?

— Tu os convidaste quando em teu desleixo deixou de vigiar-se! — rebateu-lhe o anjo o sarcasmo. — Porquanto, sendo tu quem aos teus caminhos escolheste trilhá-los (imiscuindo-se de cumprir com a sua obrigação de cuidar do pomareiro), tu optaste deixar-se assaltar por quem devias de manter longe. De certo, sendo tu o que planta, é também o que colhe! Pois, semeaste na tua trilha, ao longo de tua jornada, pensamentos autossabotadores que foram perseguindo-te e limitando-te. E estes te encontrando, roubaram-te as ameixas que te nutriam de sabedoria, e sabotaram as ameixeiras (a sua intuição) que lhe favorecia as ameixas colhê-las.

— Mas se atraí a inimigos (por ter cultivado a pensamentos au­tossabotadores e estes me roubaram os frutos que eu estava prestes a colhê-los), então, por que, doutra sorte, eu não semeei virtudes? — indagou-se pensativo o homem sobre o que o anjo lhe falou. — Se estas me eram por edificantes e saborosas a construção do meu caráter?

— As virtudes tu sempre as tiveste! — disse-lhe o guardião sa­bendo o que o vigilante pensava consigo. — Doutro modo, não as protegendo, elas te foram tiradas, por aqueles que tu alimentaste, ao se descuidar do teu ofício de vigiar ao teu pomar, de forma a afastar as ervas daninhas e pragas de consumirem os teus frutos. Portanto, conforme te disse, fomentando-os com a tua preguiça e desleixo, tu por eles me trocaste, de maneira que ficaste desprotegido de vigiá-los. Por certo, ó homem, Eu Sou quem tu deves sempre buscar, meditando e ouvindo o teu coração! Não em pensamentos ou teorias mirabolantes, mas, por outra parte, intuído tudo aquilo de bom e justo que deves saber, para que tu sejas hábil em realizar, as obras de luz e sabedoria que Deus através de ti, deseja edificar.

— Se eu o encontro no que melhor eu posso fazer — pensou o homem consigo mesmo em silêncio —, por que diabos eu o rejeitei?

— Tu me renuncias ó homem por não me crer o teu potencial de realização! — respondeu-lhe o anjo sabedor do que o vigia matutava em segredo. — E, confiando aos teus pensamentos o que podes vir-te a acontecer de bom ou ruim, tu me repudias em poder instruí-lo a fazer por meio de ti, intuindo-te, a obra de Deus.

Por consequência, viu o homem no anjo grande sabedoria e dis­cernimento, e disse-lhe:

— O senhor és muito sábio em tuas palavras! — afirmou. — E, grato lhe sou em espírito por poder fazer-me perceber onde estou a errar! Uma vez que, me deixando atrair por salteadores (ao me au­tossabotar cultivando a pensamentos medonhos), eu tolamente a demônios invoquei-os a minha presença. De tal modo que, a luz que dentro de mim está, neguei-a, ao me permitir sucumbir aos meus caprichos e a minhas vontades.

Isto posto, o anjo, então, constatando no guarda do jardim a consciência fluir, disse-lhe:

— Doravante, tu te tornaste bastante perspicaz de reconhecer de onde lhe vem o erro que te fizeste pecar! Por certo, ainda sim, tu infelizmente insistes em continuar a fazer corpo mole, quando se omite de procurar ouvir ao Deus único dentro de si, meditando e vigiando o seu templo sagrado, o coração.

Por conseguinte, o homem suspirou forte, e, então, por último pensou e falou:

— Senhor, perdoa-me por tê-lo negado! Afinal, eu me deixei su­cumbir aos meus tropeços, e não busquei em tu me reerguer.

Em função disso, o anjo, agora mais contente de o homem tê-lo entendido (ouvindo ao verbo sagrado, a sua intuição), respondeu-lhe:

— Tu a mim encontras, quando me confia dirigir-te os passos!

Finalmente, após compreender a causa do mau que o apavorou, disse o vigia:

— Agora sou conhecedor do bem e do mal! Porquanto, percebi que me autossabotando, encontrarei a salteadores que me roubarão a paz e a serenidade, incutindo-me sofrimento e vergonha. Não obs­tante, ao me manter vigilante — conforme o Cristo por meio de Jesus ensinou: “vigiai, pois, porque não sabeis o dia, nem a hora” —, estarei pronto a responder a qualquer ameaça que vier a me ocorrer, ao me armar de coragem e sabedoria, para expulsar a todo e qual­quer ladrão que tentar me sabotar o pomar. Amém!

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Sinopse

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