Gostava um homem paupérrimo de ficar numa praça se enaltecendo por ter sido premiado com um imenso tesouro. No entanto, um transeunte perguntou-lhe com deboche, além dele, quem mais havia ganhado essa imensa riqueza:
— Ô maluco! — disse o desconhecido com malícia. — Quem mais além de tu ganhou este dinheiro todo aí, pra repartir comigo também? — desdenhava sorrindo o passante.
Em seguida, de fato, seguro de si, o homem respondeu-lhe:
— Este erário — falou contente o mendigo — só a mim foi creditado!
Por sua vez, o apressado se afastou desacreditado do abobalhado que ficava na praça fazendo gestos estranhos, e falando coisas incompreensíveis a muitos que não entendiam a sua maneira extravagante de se expressar.
Até que, então, apareceu um homem esbelto por diante dele, muito bem vestido com um belo terno e segurando uma pasta, e curioso pela maneira estranha do morador de rua se exprimir, o homem fino indagou-o fazendo pouco causo:
— E que “joia” é essa que tu tanto falas, mas que a ninguém mostras?
Contudo, com ar de suspense, dando-se por feliz e satisfeito, o bobo respondeu-lhe:
— Esta “joia” como o senhor bem disse doutor... — titubeou sorrindo — só eu posso conhecê-la! Por que ela está guardada dentro do meu baú. — e se esfregava o biruta passando as mãos pelo corpo rebolando.
Com efeito, pois, se afastou o homem bem trajado, dando de ombros e meneando a cabeça, em sinal de desaprovação ao mendigo desafortunado que vivia vagabundeando na praça e vivendo da caridade alheia.
Logo, por esse motivo, os moradores do bairro que conheciam ao esmoleiro (por o verem sempre no largo fazendo mímicas estranhas), observando a cena acusaram-no de louco e alucinado, de maneira que rude e grosseira criticavam-lhe e humilhavam-no com gestos obscenos e o xingavam-no de todos os palavrões:
— Tu és um louco! — diziam quem o encontrava na praça perambulando. — Pois se regozija do que só existe em tuas mentiras e imaginações. — afirmavam eles se afastando dando com as mãos em direção aos ombros em sinal de reprovação ao comportamento do tolo.
Entretanto, o afortunado que possuía ao precioso tesouro, a todos respondia:
— Não sou louco! — expressava-se sorrindo a cada um deles. — Mas sou sortudo! — falava com alegria.
Por consequência, então, aconteceu neste mesmo dia de um homem ladino muito rico aparecer, de modo que ao mendicante desafiou-o:
— Qual é a natureza dessa riqueza que tu tanto falas? — perguntou com descaso o homem reparando nos trajes rústicos e esfarrapados do pedinte medindo-o de cima a baixo. — Se parece a nós, pobre? — concluiu o homem sorrindo com uma expressão de malvadeza e descaso total.
Todavia, sereno, o bobalhão que possuía ao tesouro que só os iniciados nos mistérios sagrados conseguiram encontrá-lo, respondeu-lhe:
— A riqueza que eu encontrei não me tornou rico por fora! — redarguiu-lhe com dignidade. — Mas rico por dentro! — e todos que o ouviam na praça dele mais ainda duvidavam, por saberem ser este homem extravagante e indigente um desocupado que vivia de pedir esmolas, sendo, pois, daí desacreditado por todos.
Posteriormente, depois de ter respondido desse modo ao seu interlocutor, o homem ladino que com astúcia a ele tinha perguntado sobre a natureza do seu tesouro, continuou a rir do bobo dando gargalhadas, em sinal de menosprezo e pouco causo:
— Rá, Rá, Rá Rá...
Não obstante, o homem exótico e carente de recursos materiais — mais rico de fé e boa-vontade para com o próximo —, respondeu ao malicioso com honra:
— Ri quem muito ganha! — disse o esfarrapado. — Mas chora quem tudo um dia haverá de deixar! — afirmou o pedinte por notar ser o homem quem o interrogou, um sujeito sínico e vaidoso, por se achar melhor do que os outros por possuir mais recursos materiais, e desdenhar da desgraça alheia. — Porque, deste mundo o homem nada levará. — continuou o indigente. — Não obstante, aquilo que ele cultivar em seu coração, isso servirá como testemunho da sua passagem aqui na Terra. — finalizou o mendincante que se afastou caminhando com o seu cachorro.
Por causa disso, notando o mendigo responder a altura dos seus adversários, apareceu outro homem estranho que também queria esnobá-lo, de modo que perguntou-lhe:
— O que eu posso perder se nada encontrei? — e de braços cruzados, olhando-o, esperou dele uma resposta.
Porém, com uma fisionomia séria, respondeu-lhe o morador de rua que já o conhecia por sempre vê-lo transitar pelo bairro, e saber ser ele um ladrão:
— Nada tu encontraste, porque dentro de si tu não procuraste! E achando-se vazio, tu só podes andar e perder-se por maus caminhos. Desse modo, tu segas onde não plantaste; e colhe o que não semeaste. Sendo, pois, daí, que haverás de um dia ter que sofrer pelos danos que causou e pela vida errante pela qual sempre andou.
Destarte, afastou-se o homem estranho por perceber ser o mendigo, alguém que possuía uma inteligência sem igual. Pois este que parecia ser um vagabundo que não tinha nem condições de fazer para se sustentar, possuía guardado dentro de si uma joia que reluzia conhecimento e sabedoria.
Por conseguinte, olharam-se os presentes uns aos outros, e depois voltaram o olhar para o bobo que foi premiado com o mais belo tesouro que já existiu, pelo que, um deles, um senhor de muita idade, sentado no banco da praça, interrogou-lhe com ar de desprezo:
— E que “ouro” é este, que tu tanto falas que encontrastes? E que só dentro de ti ele existe, e a nós tu não podes mostrá-lo? — e todos olhando-o com curiosidade, dele esperavam por uma resposta.
Consequentemente, o sortudo que desenterrou ao tesouro ocultado dentro do homem por muitas e muitas eras, aos presentes respondeu-lhes:
— Este tesouro que encontrei, vós só podereis saber o que é, quando no vosso íntimo procurá-lo! À guisa de, estando ele enterrado, deveis, pois, a ele desenterrar. E quando o encontrarem, uma grande luz de dentro de vós, brilhar-se-á. Vós deveis a este tesouro serem dignos de encontrá-lo meditando e ouvindo ao silêncio interno dos seus corações!Porque, tudo o que está dentro, se reflete no que está fora. E tudo o que está fora, é um reflexo do que está dentro. Logo, ao conseguirem encontrarem ao tesouro que eu achei, vós descobrireis (não a uma riqueza material como a estas que os homens vivem procurando pelo mundo). Contudo, acharás o homem ao tesouro que do céu desde o princípio a ele foi creditado, quando em espírito a Terra fora lançada por Deus, quando do fruto proibido comeu e os seus olhos se abriram, por ficar o homem conhecedor do bem e do mal. — e todos ficaram calados, refletindo sobre o que ele tinha respondido.
E por último, um moço entre os presentes que observava a tudo por detrás de uma grande árvore que havia na praça, usando roupas escuras e um chapéu com uma fita de setim que prendia a uma pena branca, fumando um cigarro, aproxima-se do bobo, e pergunta-lhe:
— E qual “tesouro” foi este, que: “desde o princípio foi concedido ao homem antes que em espírito a terra ele fora lançado por Deus, ao comer do fruto proibido do conhecimento do bem e do mal; e que se encontra dentro da humanidade”? — e com os olhos fixados no homem excêntrico que dispunha do tesouro, observava-o dando baforada, que as tragava do cigarro aceso.
Diante disso, o venturoso — conhecendo-o por sempre vê-lo na região próximo ao jardim da praça —, expôs-lhes o tesouro que reluzia como a uma chama num castiçal, de modo que mostrando-o também a todos os frequentadores do largo, respondeu-lhes com um sorriso todo radiante:
— Este tesouro é a sabedoria! — proferiu o esmoleiro dando risada. — Porque, o homem só conseguirá encontrar a estrada que o conduzirá de volta para o céu, ao adentrar no seu templo sagrado e descobrir, os mistérios insondáveis que só se pode ouvir ressoar de dentro do seu coração.
Dessa forma, por assim dizer, surpresos, todos os que estavam na praça entreolharam-se, de maneira que um menino que brincava no parquinho da praça, falou:
— Vejam só! — apontava o garotinho para o mendicante. — Quem diria! — falou satirizando-o. — O maluco aí parece ser um sábio! — E riam os frequentadores da praça com descaso do homem excêntrico que perambulava pelo rossio. Pois mal sabiam eles que o tesouro que o andarilho havia encontrado, era o mesmo que eles possuíam guardado dentro de si mesmos, mas que por não o procurarem no silêncio interno dos seus templos sagrados, padeciam de serem contemplados com esta imensa riqueza que o mendigo a encontrou.
Nenhum comentário:
Postar um comentário